segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Um sorriso

            Foi numa manhã como essa, cheia de sol e de calor que tudo aconteceu. Estava fazendo a minha caminhada matinal, adoro caminhar. Organizo as gavetas dos meus pensamentos, formulo agendas, reforço lembranças e nesse dia lamentava o fracasso do meu casamento e visualizava por um bom tempo a solidão que chegaria sorrateira, aproveitando-se do meu momento de fragilidade. Nada a fazer, mas muita coisa a lamentar. O anjinho do ombro esquerdo teimava com o diabinho do ombro direito me cobrando coisas que não fiz:
            - E se você tivesse feito isso.
            - E se você tivesse feito aquilo nada disso estaria acontecendo.
            Pessoas passavam por mim, a maioria correndo. Dando uma pausa a minha amargura, pensava que a maioria delas não fazia aquilo por prazer, como eu na minha caminhada. Fazia por necessidade de se afirmar, de mostrar que são capazes de correr vários quilômetros mesmo naquela idade tão parecida com a minha em que o corpo prefere apenas caminhar. Não gosto de correr. Não gosto da pressa do chegar logo. Irrita-me. Gosto de andar. Observar coisas, pessoas, paisagens, sentir cheiros, sentir o vento nos meus cabelos grisalhos, ouvir pedaços de conversas das pessoas que passam e juntá-los com as minhas deduções malucas, criando boas histórias. A maioria alegre. Gosto da alegria. A alegria é contagiosa basta que a espalhemos.
Foi nesse momento que senti um esbarrão. Olhei irritado para a pessoa que havia feito isso e dei de cara com o mais belo sorriso da minha vida. Sorriso de desculpa, sorriso que me trouxe à tona dos meus pensamentos tristes. Fiquei paralisado olhando aquela fantástica aparição. Um sorriso que iluminou toda a estrada, um olhar meigo, o cabelo desgrenhado pela ação do vento que mostrava a ação do tempo e nem por isso lhe tirava a beleza; uma correntinha no pescoço completava o quadro. E eu ali, parado, sem ter o que dizer, sem saber o que fazer além de olhar e me encantar. Quando você foi embora. Virou-se para olhar-me várias vezes e na última acenou.
            Quando voltei a mim e vi que você havia desaparecido, corri ao seu encalço. Esqueci que não gostava de correr. E corri vários metros que mais me pareceram quilômetros e não mais lhe encontrei. Como lamentei depois do ocorrido não ter lhe falado, não ter lhe escutado, não ter iniciado alguma coisa, de alguma forma que não lhe permitisse sumir. De nada adianta agora fazer o mesmo percurso olhando todos os rostos na esperança de encontrar no meio deles o seu. Agora não adianta mais. Fico pensando na felicidade que eu poderia ter tido e deixei escapar naquela manhã cheia de sol e de calor.

Texto: Marta Adalgisa Nuvens